Crianças na crise de casal
- clinicajardins
- 30 de out. de 2014
- 2 min de leitura
Um casal que briga muitas vezes desvia sua atenção e sua preocupação para seus filhos. Atualmente muitos pais se responsabilizam por cada angustia sentida pela criança, e tomam a crise conjugal como potencial trauma. Mas até que ponto elas são realmente afetadas?
Claramente não se pode sugerir que exista um molde fixo de reação para encaixar todas as crianças, mas existem considerações gerais tanto em relação à criança como em relação aos pais nesse tipo de situação.
A briga é de alguma maneira um exemplo de angustias geradas pelo desencontro da expectativa com a realidade, e descontar no parceiro é uma das defesas para esse incômodo. Se esse incomodo se torna grande demais a pessoa arruma uma maneira de se defender dele, assim, se a pessoa consegue se conformar de alguma maneira com aquele desencontro já temos uma situação mais suportável e controlável. Pode parecer uma lógica circular, mas o importante aqui é ressaltar que a angustia também ajuda a criança a se preparar para lidar com esses desencontros no futuro, e que poupá-la de tudo isso pode ter um efeito mais prejudicial do que benéfico.
É como o sistema imunológico, a criança pode ser protegida de encontro com agentes nocivos, mas ao mesmo tempo não criará anticorpos para situações mais complicadas no futuro. O melhor é exercer o bom senso com a compreensão que a tristeza é também uma professora para a criança.
Ainda em relação à criança, a briga do casal pode ser compreendida ao olhar dela de diversas maneiras e a maneira como os pais nomeiam essa briga influencia essa compreensão. Geralmente os pais se concentram em garantir à criança que eles ainda a amam e não estão brigando por causa dela, o que é um bom reasseguramento, mas não deve ser o único. A criança teme inconscientemente muitas vezes ter que dar conta da felicidade dos pais agora que o conjugue não está mais lá, e muitas vezes isso é expresso sem que se dê conta quando o pai ou a mãe explicam para a criança que ainda a amam profundamente e que ela, diferente do conjugue, não decepciona.
Uma terceira questão em relação à criança, muito pouco abordada, é a sensação do quão potente pode ser o ódio dos pais e por vários mecanismos internos se sentir vulnerável frente essa raiva.
Mas talvez a questão mais ignorada seja o desvio de atenção dos pais. Quando um casal para de brigar para se preocupar com a criança eles criam um espaço de trégua onde a raiva de ambos fica restrita e o carinho volta a tona. Em longas crises esse pequeno oasis de tranquilidade, por mais que permeado por uma segunda angustia em relação à criança, dá força para que eles continuem tentando fazer o relacionamento funcionar. Por isso mesmo que é importante tentar não usar essa trégua para pegar o outro desprevinido, usando a falta de atenção com a criança como arma e a alavanca da própria compaixão frente o desinteresse do outro usando o filho como cabo de guerra.
Lucas Nogueira
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