Diagnóstico de TDAH
- Marcelo Hanftwurzel
- 15 de out. de 2014
- 3 min de leitura
Atualizado: 13 de jun. de 2024
Diagnosticar TDAH infantil é muito mais difícil do que parece.
O TDAH, Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas. O seu aparecimento ocorre na infância e normalmente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Os sintomas se caracterizam por: desatenção, inquietude e impulsividade.
Muito se discute a existência ou não do transtorno, acredito que tal discussão seja inócua, pois pela minha experiência clínica posso afirmar que: sim existe o TDAH, mas não na quantidade diagnosticada e divulgada. A divulgação pela mídia e indústrias farmacêuticas vem confundindo a população, em especial pais e escolas.
É espantosa a quantidade de adultos que trazem ao consultório crinças com um diagnóstico “caseiro” de TDAH, em sua grande maioria feita por pesquisas no GOOGLE.
Eles não estão errados ao se identificar com os critérios do DSM V ou CID 10, porém, uma leitura mais atenciosa revelará que tais critérios só podem ser considerados se forem excluídas situações de luto, depressão, stress agudo, dentre outras.
Para ilustrar melhor a situação que tento descrever vamos imaginar um adulto que durante os últimos meses vem passando por uma crise conjugal, problemas com a saúde dos pais e agora uma ameaça de desemprego. Tal situação fará com que seus pensamentos e, consequentemente, sua atenção, seja desviada para os problemas atuais. Como resposta ele poderia ficar “aéreo”, agitado, distraído, agressivo, esquecido, descuidado, etc...
Convido quem estiver passando ou já passou por situação parecida a pesquisar os critérios para TDAH no GOOGLE. Asseguro que será difícil não se auto diagnosticar como portador do transtorno.
Agora imaginemos o que ocorre com as crianças não portadoras de TDAH e que estão passando por situações angustiantes como: divórcio dos pais, luto de um parente ou dificuldade financeira na família, como a criança irá lidar com tal situação?
A capacidade egóica e cognitiva da criança dificulta a possibilidade de “digestão” da situação estressante vivida e a consequência à essa angústia criada provavelmente será manifestada por sintomas que preencherão os critérios diagnósticos de TDAH.
Muitas vezes quando os pais trazem à clínica uma criança com sintomas de TDAH e descrevem que esses se iniciaram de forma abrupta e incisiva, devemos desconfiar dos possíveis aspectos neurológicos e especular sobre os aspectos psicológicos em questão. Uma criança não se torna TDAH de hora para outra.
A questão é que o TDAH não é um diagnóstico feito somente através de sintomas passageiros, não se trata de uma doença como a gripe em que os sintomas desaparecem no momento que a pessoa se recupera. Um adulto com TDAH foi inevitávelmente uma criança com o transtorno.
O importante é compreender o que é um sintoma e o que ele pode representar para uma criança. Muitas vezes na criança o sintoma é um recurso que ela encontrou para canalizar ou descarregar suas angústias, impedindo assim que estas venham destruir seu equilíbrio interno. Desta forma o sintoma deixa de ser olhado apenas como uma disfunção neuroquímica ou neuroanatômica, algo a ser anulado ou controlado e sim como um representante simbólico das angústias que a criança não consegue elaborar.
A clínica com crianças trabalha com estes sintomas, os de origem psicológica, resignificando e dando sentido à eles. Desta maneira atua diretamente nos núcleos de angústia possibilitando instrumentalizar a criança com outros recursos internos. Consequentemente o sintoma deixa de ser a única maneira de ela se manifestar e manter sua saúde psiquica.
Logo, algumas crianças diagnosticadas prematuramente com TDAH não são portadoras de fato deste transtorno. Os sintomas, por mais semelhantes que sejam aos verdadeiros casos de TDAH, na verdade são representantes simbólicos de uma angústia e não podem ser considerados como único aspecto do diagnóstico.
Existem crianças e adultos com TDAH que se beneficiam e muito de um diagnóstico correto, porém, os profissionais que farão a avaliação devem estar preparados para um olhar abrangente do paciente.
Nas crianças o cuidado deve ser redobrado, diagnosticar na infância significa muitas vezes rotular e criar um estigma que dificilmente será abandonado pelos parentes e pela própria criança no decorrer de sua vida.
Marcelo Hanftwurzel
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